ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA COM O OBJETIVO DE DISCUTIR QUESTÕES RELATIVAS À SUSTENTABILIDADE INDÍGENA NA CIDADE DE PORTO ALEGRE E AO SISTEMA MUNICIPAL DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO – PRIMEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA QUINTA LEGISLATURA, EM 28-4-2009.

 


Aos vinte e oito dias do mês de abril do ano de dois mil e nove, reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às nove horas e trinta minutos, o Vereador Adeli Sell assumiu a presidência e declarou abertos os trabalhos da presente Audiência Pública, destinada a discutir questões relativas à sustentabilidade indígena na Cidade de Porto Alegre e ao Sistema Municipal de Unidades de Conservação – SMUC –, conforme requerido pelo Núcleo de Apoio Operacional de Porto Alegre da Fundação Nacional do Índio – FUNAI – e pela Defensoria Pública da União – Núcleo de Porto Alegre –, por meio do Processo nº 0511/09. Compuseram a Mesa: o Vereador Adeli Sell, 1º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; o Senhor João Maurício Farias, Coordenador do Núcleo de Apoio Operacional de Porto Alegre da FUNAI; o Senhor Juliano Stella Karam, representando o Ministério Público Federal; o Senhor Luiz Fernando Caldas Fagundes, representando a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana; o Senhor Marco Antônio Macerata, representando a Secretaria Municipal de Saúde; o Senhor Dulcimar Portella, representando a Fundação de Assistência Social e Cidadania – FASC –, e a Senhora Warna Fruhauf, representando a Associação Riograndense de Empreendimentos de Assistência Técnica e Extensão Rural – EMATER. Também, durante os trabalhos, foram registradas as presenças, neste Plenário, das Senhoras Lilian Alves Aeckermann, Leila Schaan e Sônia Lopes dos Santos, respectivamente integrante da Defensoria Pública da União no Estado do Rio Grande do Sul, Coordenadora de Direitos Humanos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana e Coordenadora do Conselho Estadual dos Povos Indígenas – CEPI –; do Senhor Sérgio Bittencourt, representando a Vereadora Juliana Brizola, e dos Vereadores Engenheiro Comassetto, Ervino Besson, João Pancinha, Pedro Ruas e Reginaldo Pujol. A seguir, o Senhor Presidente prestou esclarecimentos acerca das normas a serem observadas durante a presente Audiência Pública. Após, foram iniciadas as manifestações das entidades inscritas para pronunciamento, tendo o Senhor Presidente concedido a palavra aos Senhores João Carlos Padilha e Evilásio Rodrigues Domingues, representando, respectivamente, a comunidade indígena da Vila Parque Índio Jari, do Bairro Morro Santana, e a Associação dos Artesãos do Brique da Redenção. Em prosseguimento, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Senhor João Maurício Farias, Coordenador do Núcleo de Apoio Operacional de Porto Alegre da FUNAI, entidade proponente da presente Audiência Pública. Na oportunidade, o Senhor João Maurício Farias procedeu à entrega, ao Senhor Presidente, de documentação elaborada por entidades ligadas à questão indígena, solicitando que o Sistema Municipal de Unidades de Conservação contemple reivindicações das comunidades indígenas e propugnando pela criação de parques ambientais no Município, tendo o Senhor Presidente determinado a anexação dessa documentação ao Projeto de Lei Complementar do Executivo nº 005/07 (Processo nº 4079/07), que institui o Sistema Municipal de Unidades de Conservação da Natureza de Porto Alegre e dá outras providências. Após, o Vereador Pedro Ruas formulou Requerimento verbal, deferido pelo Senhor Presidente, solicitando fosse ampliado o número de inscrições para manifestações da presente Audiência Pública. A seguir, foi dada continuidade aos debates, tendo o Senhor Presidente concedido a palavra à Senhora Lisbet Santos Pinheiro, da Comissão Deliberativa do Brique da Redenção; ao Senhor Francisco dos Santos, da comunidade indígena Caingangue do Morro do Osso; ao Senhor Valdomiro Vergueiro, Cacique da comunidade indígena Caingangue do Morro do Osso; ao Senhor Eli Fidelis, da comunidade indígena Caingangue da Vila Safira, do Bairro Morro Santana; ao Senhor Arno Cláudio Trapp, do Conselho Consultivo do Parque Natural do Morro do Osso; ao Senhor Jaime Alves, Cacique da comunidade indígena Caingangue do Bairro Lomba do Pinheiro; ao Senhor José Cirilo Pires Morinico, Cacique da comunidade indígena Guarani do Bairro Lomba do Pinheiro; ao Senhor Ruben Marques Pacheco e à Senhora Adelaide Canozzi, Artesãos do Brique da Redenção; ao Senhor Antonio Ruas, Professor do Curso Superior de Tecnologia em Gestão Ambiental da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul – UERGS –; ao Senhor Ari Ribeiro, do Movimento Indígena Lomba do Pinheiro; ao Senhor Jorge Tadeu Teixeira Senna, da Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular e Saúde; ao Senhor Renato Farias dos Santos, Presidente da Associação dos Moradores da Rua Otto Ernst Meyer – AMOTEM –; ao Senhor Vherá Poty, Cacique da Reserva Indígena Guarani do Canta Galo, do Bairro Lami; ao Vereador Engenheiro Comassetto; ao Senhor Juliano Stella Karam, representando o Ministério Público Federal; ao Senhor Luiz Fernando Caldas Fagundes, representando a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e a FASC, e ao Senhor Marco Antônio Macerata, representando a Secretaria Municipal de Saúde. Na ocasião, em face de Questão de Ordem formulada pelo Vereador Engenheiro Comassetto, o Senhor Presidente prestou esclarecimentos acerca dos limites legais da atuação da Câmara Municipal de Porto Alegre e dos espaços para manifestação dos Senhores Vereadores e da comunidade junto a este Legislativo. Após, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Senhor João Maurício Farias, para as considerações finais acerca do tema em questão. Às onze horas e trinta e oito minutos, nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente declarou encerrados os trabalhos da presente Audiência Pública. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Adeli Sell. Do que eu, Adeli Sell, 1º Vice-Presidente, determinei fosse lavrada a presente Ata, que será assinada pelos Senhores 1º Secretário e Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Estão abertos os trabalhos da presente Audiência Pública, convocada por Edital, assinada pelo Presidente desta Câmara, Ver. Sebastião Melo, do dia 03 de março de 2009, com o seguinte teor: (Lê Edital de Retificação.) “Audiência Pública com o objetivo de discutir as questões de sustentabilidade indígena na cidade de Porto Alegre e o Sistema Municipal de Unidades de Conservação – SMUC”. O Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, no uso de suas atribuições legais, comunica à comunidade porto-alegrense a realização de Audiência Pública, nesta data, no Plenário Otávio Rocha, na Av. Loureiro da Silva, n.º 255, com o objetivo de discutir questões relativas à sustentabilidade indígena na cidade de Porto Alegre e o Sistema Municipal de Unidades de Conservação.”

De antemão, quero dizer que o Presidente Sebastião Melo tem um outro compromisso. Eu sou o Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, meu nome é Adeli Sell, e eu terei o prazer de dirigir esta Audiência Pública. Convido a compor a Mesa os requerentes desta Audiência, Sr. João Maurício Farias, Coordenador do Núcleo Funai, Porto Alegre (Ausente.); o Dr. Juliano Stella Karam, representante do Ministério Público Federal; Sr. Luiz Fernando Caldas Fagundes, representante da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana; Sr. Marco Antônio Macerata, representante da Secretaria Municipal de Saúde; Sr. Dulcimar Portella, representante da Fundação de Assistência Social e Cidadania – FASC; Srª Warna Fruhauf, representante da Emater.

Para as pessoas que gostariam de fazer uso da palavra, já estão abertas as inscrições. Podem se dirigir à esquerda da Mesa, são dez inscrições. Inclusive, se as pessoas quiserem usar as cadeiras aqui na frente, por favor, podem utilizá-las sem nenhum problema.

Vou explicar rapidamente, já que os dois requerentes não se encontram no horário aprazado, do que se trata este Projeto de Lei. É um Projeto de Lei do Executivo Municipal, da Prefeitura Municipal de Porto Alegre, fala da instituição do Sistema Municipal de Unidade de Conservação de Natureza de Porto Alegre – SMUC. É um Projeto que trata, em vários capítulos, por exemplo, do Sistema Municipal das Unidades de Conservação da Natureza: diz que tipos de Unidades; quais as categorias de conservação, como da criação, implantação e gestão dessas unidades; como será feita essa gestão do plano de manejo, quando houver plano de manejo; o Conselho; as compensações ambientais, as infrações e penalidades. E nós temos um conjunto de Emendas que está disponível para todas as pessoas que queiram consultar. Eu tenho aqui o Projeto e o primeiro conjunto de Emendas. E pelo que eu fui informado agora, um conjunto de Emendas entrou no sistema ontem. As primeiras nove Emendas que foram protocoladas em 14 de abril de 2008 são deste Vereador, Adeli Sell. Há Emendas da Comissão de Direitos Humanos, do ano passado, dirigida pelo Ver. Guilherme Barbosa, e estou esperando que elas cheguem à Mesa. O processo está à disposição aqui na Mesa para consultas, bem como para aqueles que queiram consultar, temos a nossa Diretoria Legislativa aqui, e também está no sistema da Câmara Municipal.

O Sr. João Carlos Padilha, da comunidade Índio Jarí, Morro Santana, está com a palavra.

 

O SR. JOÃO CARLOS PADILHA: Bom-dia a todos, quero agradecer a oportunidade que estou tendo de falar, agradecer à Câmara, agradecer ao pessoal que está aqui presente, e quero dizer que para a comunidade indígena o desafio hoje é poder viver nas duas culturas, e que a sociedade brasileira, principalmente de Porto Alegre, aceite mais o índio do jeito que ele é. E, principalmente no Brique da Redenção, a gente está procurando espaço para poder sobreviver; nós estamos procurando espaço para sobreviver. Estamos procurando uma maneira justa, digna, de sobrevivência na grande cidade, porque nós fomos expulsos da nossa terra, perdemos tudo que tínhamos e tivemos que vir para a grande cidade, para sobreviver aqui em Porto Alegre. Então, precisamos de quê? De que a sociedade aceite a nossa cultura, precisamos fazer inclusão social das comunidades indígenas, dos grupos que hoje vivem nas grandes cidades, principalmente em Porto Alegre, principalmente nos matos, nas reservas florestais, que hoje não têm espaço, a gente está “forçando a barra” sempre para poder tirar um cipó, para poder tirar uma taquara para poder fazer o artesanato, o remédio de ervas. Então, a gente precisa que o Município de Porto Alegre, a SMIC, a sociedade abram esses espaços para nós podermos sobreviver melhor, honestamente, dignamente. O que a gente quer é espaço para sobreviver. O Município de Porto Alegre tem muito a fazer, porque é um Município rico, um Município que tem estrutura, que pode muito bem fazer mais pelas comunidades indígenas, eu tenho certeza. A inclusão social do índio na sociedade ainda está muito carente, porque ainda não foi entendida, digamos, tanto pelas autoridades como pela sociedade brasileira.

Quando chegamos em Porto Alegre, nos anos 80, foi lamentável a maneira como nós fomos excluídos. Nós fomos jogados às traças, nós fomos jogados pelas estradas; sobrevivemos porque fomos fortes. Para tirar um cipó e uma taquara, a gente vivia peregrinando pela beira das estradas. Nós não éramos aceitos, e o pessoal comentava que tinha que levar a gente de volta para casa, e nós dizíamos: mas nós não temos casa, nós não temos terra, para onde vocês vão nos levar?

Então, a aceitação, em Porto Alegre, do índio foi péssima, foi muito carente, e nós sofremos isso na nossa pele. No tempo da tutela, da Lei nº 6.001, que estava na Constituição Federal, os índios eram agarrados e jogados lá não sei aonde, lá numa reserva, e tinha que ter licença para poder sair da sua área; tinha que ter licença da própria Funai para poder sair. Nós éramos considerados presos, considerados prisioneiros de guerra. De 1988 para cá, senhores e senhoras, é que nós conseguimos abrir um espaço dentro da Constituição Federal para que o índio pudesse ir e vir sem que precisasse prestar contas para ninguém. E isso, até agora, não foi respeitado, e nós não somos aceitos na sociedade, ainda, até hoje. Passou-se 500 anos e não foi feita a inclusão social das comunidades indígenas da maneira certa, respeitando a própria cultura. Muito obrigado. (sic)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Obrigado. Anuncio a presença do Coordenador do Núcleo da Funai de Porto Alegre, o Sr. João Maurício Farias.

O Sr. Evilásio Rodrigues Domingues, da Associação dos Artesãos do Brique da Redenção, está com a palavra.

 

O SR. EVILÁSIO RODRIGUES DOMINGUES: Gostaria, em primeiro lugar, de dar um bom-dia a todos que estão aqui, agradecer a presença de todos que estão lutando por um espaço na sociedade e fazer a manifestação em nome da Associação dos Artesãos do Brique da Redenção, fazendo um breve relato das nossas atividades naquele espaço cultural da cidade.

Há 30 anos, foi criada pela Prefeitura Municipal de Porto Alegre uma Feira que se chamava Mercado das Pulgas, localizada na Av. José Bonifácio nas imediações com a Av. João Pessoa, com o objetivo de comercializar antiguidades. Quatro anos depois, um grupo de artesãos deu início a uma Feira de Artesanato que, no seu começo, funcionou dentro do Parque Farroupilha. Passados alguns meses, foi deslocada para o canteiro central da Av. José Bonifácio, e desde então se consolidou como o Brique da Redenção. Após alguns anos, em decorrência dos problemas encontrados e na expectativa de resolvê-los, houve um consenso para a criação de um seminário, onde seriam discutidas soluções para qualificar aquele espaço de cultura e lazer, nos finais de semana, dos que moram na Cidade. Esse seminário foi chamado de Brique 90, em alusão ao ano de sua criação. Após alguns dias de discussões, algumas resoluções foram tomadas, entre elas, a criação de um espaço destinado à cultura indígena. Consta no documento que, com o objetivo de resgatar a cultura indígena e garantir espaço de trabalho para os índios, que hoje são marginalizados como artesãos, serão garantidos dois boxes para as tribos indígenas, que serão dispostos nas vagas criadas entre os canteiros. Além da comercialização da sua produção artesanal, esse será um espaço para divulgação das questões das minorias indígenas. As atividades deverão ser desenvolvidas com a participação de entidades afins, como a ANAI, CIMI, etc., que eram entidades da época. Apesar de as entidades citadas nunca terem participado dessa proposição, os expositores do Brique da Redenção, notando que o espaço era insuficiente para os índios, desenvolveram uma luta para que fosse liberado o primeiro canteiro da Avenida, a fim de que ali fosse instalada a Feira de Artesanato Indígena, constando nesse espaço mais de 15 boxes. Por omissão da Prefeitura, não houve cadastramento dos ocupantes dos canteiros, tampouco houve acompanhamento na organização dos mesmos. Em setembro de 2003, o Brique foi surpreendido com um acordo feito entre a Secretaria Municipal de Indústria e Comércio, o Ministério Público Federal e representantes dos indígenas, sem a presença dos representantes do Brique. Esse acordo estabeleceu a quantidade de espaço criado para os expositores indígenas, com limites a serem respeitados, mas novamente houve omissão da Prefeitura não fazendo o cadastro e acompanhamento do cumprimento do acordo; de maneira que hoje, além do espaço determinado, há a ocupação do espaço triplicada. Lembramos que, segundo a lei que instituiu o Brique, é determinante que as bancas sejam localizadas nos canteiros, deixando o leito da rua sem obstrução para uso dos frequentadores. Por várias vezes, a Comissão Deliberativa do Setor do Artesanato cobrou oficialmente da SMIC o cumprimento do acordo feito entre as partes. Também foi enviado ao Ministério Público Federal documento pedindo que o mesmo determinasse a validade do acordo, porque, do nosso ponto de vista, se um acordo não é cumprido, não tem razão de ser o acordo. Nós temos o croqui, temos os mapas, tudo determinando o que foi acordado. Não tendo sido atendidas as nossas reivindicações, resta-nos vir a esta Audiência Pública para exigir o cumprimento do acordo, esperando que desta vez não haja omissão da SMIC, recolocando os expositores no local determinado e fazendo o seu cadastramento, haja vista que tal procedimento já é feito com os demais expositores do Brique. Não fazemos discriminação; queremos, sim, igualdade entre todos os expositores que ocupam aquele espaço público. E lembramos mais uma vez que o Brique da Redenção é um espaço para o produtor vender o seu produto, resultado do seu trabalho; não um produto comprado por atacado, o que descaracteriza a feira e transforma aquele espaço público de uma maneira muito peculiar, e nós queremos preservá-lo. Então, é importante que o espaço se mantenha com as características de produção artesanal. Queremos, sim, que os povos indígenas tenham espaço no Brique, mas queremos que eles vendam os trabalhos produzidos por eles, mostrando, assim, a sua cultura para toda a comunidade. É isso. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Tenho o prazer de anunciar a presença da Drª Lílian Alves, da Defensoria Pública da União. Pelo nosso rito das Audiências Públicas, as pessoas que fizeram o requerimento que gerou o evento falam no início. Se o Sr. Maurício e a Drª Lílian quiserem falar agora, eu faço uma pequena interrupção e passo a palavra para vocês nesse momento. Pode ser? Nesse caso, os proponentes têm dez minutos.

Então, eu passo a palavra ao Sr. João Maurício Farias.

 

O SR. JOÃO MAURÍCIO FARIAS: Bom-dia a todos; bom-dia ao Ver. Adeli Sell, que está presidindo esta Audiência Pública; Dr. Juliano, do Ministério Público Federal; Sr. Luiz, que está representando o Núcleo de Políticas Indígenas da Prefeitura; Drª Lílian; a Emater, que também está representada aqui; Sr. Cirilo, que é o Cacique-Geral da Aldeia Guarani, da Lomba do Pinheiro; Vice-Cacique da Aldeia Caingangue da Lomba do Pinheiro; o Roberto, Cacique do Lami; Cacique Valdomiro, da Comunidade do Morro do Osso; outros núcleos familiares; caingangues da região; e Cacique Vherá Poty, da Aldeia Guarani do Cantagalo. O que nos traz a fazer esta Audiência Pública? Várias questões têm aumentado a dificuldade da sustentabilidade indígena na cidade de Porto Alegre. Foi colocada, agora, a questão do Brique. O Brique é só uma parte da questão da sustentabilidade, é onde eles comercializam os produtos de artesanato que eles produzem. O produto principal do sustento indígena das comunidades que estão na Região Metropolitana é a venda do artesanato: os balaios dos caingangues, os colares; os bichinhos de madeira, colares e cestos dos guaranis. Eles colocam o seu artesanato no Brique e também em outros locais de Porto Alegre. Agora, no domingo, foi inaugurada uma loja, uma parceria da Prefeitura com as lideranças indígenas e com uma entidade ambiental de Porto Alegre e o Iecam - Instituto de Estudos Culturais e Ambientais -, que trabalha com os índios. Então, o artesanato já está dando um outro salto de qualidade. E a dificuldade do Brique da Redenção é que os indígenas têm o direito... A gente precisa se dar conta de que eles são originários destas terras; então, quando a gente olha um indígena caingangue, um indígena guarani, e agora os charruas que estão se agrupando, estamos olhando para os povos originários destas terras, da Bacia Hidrográfica do Guaíba. Então, para nós, e para eles, eles têm o direito de acessar esse espaço. E os conflitos que acontecem hoje em dia são em função da sobreposição de território. Nós construímos a Cidade em cima dos territórios indígenas. Então, o que a gente precisa fazer? A gente precisa adequar, na nossa cultura, a cultura do não índio, da melhor maneira possível, e criar regramentos que facilitem a nossa relação com essas comunidades, e não pode ser o contrário, restringindo cada vez mais a possibilidade deles continuarem existindo como etnia indígena. Que eles possam ter seus filhos, seus netos, a sua cultura construída e preservada, passando de pai para filho. Então, é fundamental que a gente melhore a relação. Eles têm apontado, já há muito tempo, para os setores públicos daqui, que trabalham com política pública, porque melhorar no Brique significa ter um espaço exclusivo, ampliar o espaço, talvez ali ao lado, onde fica o estacionamento do Mercado do Bom Fim, para que eles também possam vender e expor os materiais com melhor qualidade. Outra questão que eles nos apontam é com relação ao acesso aos espaços onde há matéria-prima. Cada vez tem-se reduzido mais o acesso à matéria-prima. Com o adensamento urbano da Região Metropolitana, percebemos que a cada ano diminuem os espaços de mata, que são os locais preferidos, onde eles buscam matéria-prima. Como é o local preferido para buscar matéria-prima, também é um local onde há relação de preservação, porque é de lá que também vem o seu sustento, é lá que acontece a cultura dessas etnias, que se consolida na relação com o mato, na relação com a busca da matéria-prima, com as plantas medicinais; é lá que a cultura deles também é preservada. Então, quando a gente faz uma lei, e essa lei acaba diminuindo o acesso dessas comunidades aos espaços, a gente está atuando frontalmente para diminuir a condição para que eles permaneçam existindo, e disso nós temos que nos dar conta. E isso é muito grave. Nós precisamos resolver esses conflitos de outra forma.

Há o debate da sustentabilidade com a questão do espaço comercial. Nós precisamos, com a Câmara de Vereadores, e com o Município de Porto Alegre, do ponto de vista da política indígena, ser um exemplo para o País, tenho que afirmar isso. Tenho certeza de que não há uma Prefeitura no País que tenha um trabalho consequente, que apoie no dia a dia a questão indígena. Isso tem que ser reconhecido.

Sobre o SMUC – Sistema Municipal de Unidades de Conservação –, do ponto de vista ambiental, pode significar um enorme ganho para a Cidade. E os indígenas não são contrários a isso, porque os interesses deles não vão contra a preservação ambiental. Só que o SMUC, como foi montado, não contemplou as questões indígenas; não foi contemplada a relação indígena com esses espaços. É fundamental que a gente reveja, e que sejam incluídas as emendas propostas no ano passado, quando foram feitas várias reuniões pela Comissão de Direitos Humanos - está aqui o assessor da Comissão, Renato -, da qual os indígenas participaram, construíram as emendas, e essas emendas estão na Câmara.

Hoje nós estamos trazendo um documento construído pelas entidades que apóiam a questão indígena, pelas lideranças indígenas, e que foi bastante debatido. Este documento nós vamos, oficialmente, entregar para a presidência dos trabalhos. As lideranças querem que ele seja analisado com toda a seriedade, solicitando que o SMUC contemple o direito indígena - isso é fundamental -, como também a criação de parques ambientais no Município. Os indígenas estão apontando que os parques ambientais, a partir do dia de hoje, tenham o caráter de sustentabilidade, com o uso sustentável por povos originários, por etnias indígenas. Não é o uso sustentável para a exploração de madeira, por exemplo; não se está tratando disso. São parques sustentáveis que contemplem a relação indígena de acesso ou de presença nos parques.

Há estudos demonstrando que uma área ambiental, no País, hoje, com presença indígena, é melhor preservada do que uma área sem a presença indígena. E isso a gente tem que olhar, pois já se comprova em Porto Alegre que, onde há a proximidade com os indígenas, os parques apresentam melhor qualidade. É fundamental que a gente incorpore isso.

O Brasil é signatário da Convenção nº 169, da OIT – Organização Internacional do Trabalho –, que trata da questão dos povos indígenas, do direito de eles terem a sua cultura preservada e o dever dos Estados para que essas culturas permaneçam, continuem existindo. Não é só o Brasil; o Brasil, a Argentina e outros Países do mundo são signatários. Há um artigo nessa Convenção que deixa bem claro que, para poder fazer qualquer Projeto de Lei que afete o interesse indígena, este deve ser precedido por consulta prévia. Então, criar um Projeto de Lei, como o SMUC, aqui na nossa região, afeta diretamente o Direito Indígena. Para isso precisa haver consulta prévia, como também para a criação de qualquer parque ambiental em Porto Alegre.

O que está sendo colocado é que para poder avançar esse Projeto é preciso que a consulta prévia não apenas ouça, no sentido formal, mas ouça e agregue propostas indígenas para dentro do Projeto. Se for feita só do ponto de vista formal, como numa Audiência, onde se ouviu e na hora votou-se, mas não se colocou nada no Projeto de interesse indígena – isso não tem validade.

É preciso que se faça discussões com as lideranças sobre esse importante Projeto, para que consigamos avançar com essas propostas; para que consigamos ver os netos do Cirilo vivendo aqui na região de Porto Alegre, em boas condições - se eu estiver vivo daqui a vinte anos, gostaria de ver isso -, quando, tenho certeza, a condição ambiental de Porto Alegre estará bem melhor que hoje. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Nós vamos pedir para anexar esse material, que nos foi entregue agora, ao Projeto de Lei que está em tramitação. Eu queria, como disse anteriormente, lembrar que temos 33 Emendas; as nove primeiras Emendas são de minha autoria; as outras Emendas, as de número 10 a 33, são fruto da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos e foram assinadas pelo Ver. Guilherme Barbosa.

Também queremos dizer que esta é uma Audiência Pública, e o Projeto está em andamento. Houve um pedido recente de votação de urgência urgentíssima, mas não houve acordo, exatamente para que as Emendas fossem rediscutidas na Comissão de Constituição e Justiça. Quero também dizer que as entidades que estão aqui, além de se manifestar livremente neste momento, têm o expediente da Tribuna Popular. Qualquer entidade pode utilizar a palavra por dez minutos, no início das Sessões de segundas, quartas e quintas-feiras, colocando questões atinentes a esse Projeto de Lei, se acharem conveniente. Então, podem utilizar todos esses expedientes. Se necessário for, faço parte da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, e a nossa Presidenta Juliana, poderá também marcar uma reunião específica nessa Comissão, porque essa Comissão trata desses temas. Então, estamos colocando isso à disposição de todos.

Quero também anunciar a presença do Ver. Pedro Ruas, que nos honra com a sua presença e está com a palavra.

 

O SR. PEDRO RUAS (Requerimento): Ouço com atenção, Presidente dos trabalhos, Adeli Sell, e, em primeiro lugar, cumprimento V. Exª pelo trabalho já de bastante tempo nessa área e também pela coordenação dos trabalhos no dia de hoje. Mas faço um Requerimento a V. Exª no sentido de que possibilite que, pelo menos - ainda há cinco nas inscrições livres de cinco minutos -, as entidades possam se inscrever. É um pedido que tenho recebido agora no plenário, e apelo à sensibilidade de V. Exª, até para valorizar mais a Audiência Pública nesse sentido. Obrigado, Vereador.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Defiro seu Requerimento. Na verdade, são, de regra geral, dez inscrições, mas, como começamos no horário e todo mundo está cumprindo rigorosamente o horário, defiro. Então, mais cinco inscrições, para que a gente possa contemplar a todos, e, como já disse anteriormente, há outros expedientes que a Câmara disponibiliza. Depois, no final, as pessoas que tiverem dúvidas podem vir falar comigo, com o Ver. Pedro e com os outros Vereadores que poderão vir mais tarde aqui, e nós orientaremos sobre todas as formas de participação nas Comissões Técnicas, na Tribuna Popular e nas audiências que faremos aqui.

Eu também anuncio a presença da Coordenadora do Conselho dos Povos Indígenas, Srª Sônia, e convido-a para fazer parte da Mesa.

A Srª Lisbet Santos Pinheiro, da Comissão Deliberativa do Brique da Redenção, está com a palavra.

 

 A SRA. LISBET SANTOS PINHEIRO: Bom-dia, senhores e senhoras, eu acho muito louvável toda essa luta indígena, eu que sou representante também de uma minoria negra, pobre e excluída. Moro ao pé do Morro São Pedro onde há problemas sérios de preservação. Eu só sinto e lamento que, na luta indígena, eles estão esquecendo do que realmente significa preservar, do que significa estar no seu meio e mostrar para as pessoas a sua cultura verdadeira, quando é feito o seu artesanato verdadeiro, quando se mostra a sua cultura, quando vão para a rua mostrar os seus trabalhos e realmente mostram o que se fazem com dignidade, isso é louvável. É isso que nós, os artesãos do Brique da Redenção, queremos: desejamos que eles façam, assim como nós fazemos - nós, artesãos -, mostrando a nossa cultura e a nossa dignidade, estamos lá e mostramos o nosso artesanato, tudo o que fazemos com as nossas mãos, do nosso jeito, e cada um, na sua cultura, mostra o que faz e o que sabe fazer.

Nos últimos tempos, os indígenas que expõem no Brique da Redenção estão se descaracterizando e assim perdendo o que têm de melhor e de mais bonito. É isso que o Brique da Redenção vem pedir para eles, vem exigir que eles possam fazer, que eles possam mostrar. Sim, somos a favor de que eles estejam lá, que eles tenham o seu espaço, a sua dignidade, a valorização do seu trabalho e da sua cultura, assim como eu, particularmente, moradora do Morro São Pedro, sou favorável que eles estejam lá também, no Morro São Pedro, ajudando, preservando e mostrando como é que se faz, como se vive na natureza e em paz. Mas, para isso, tem que ser bem-feito, tem que ser com dignidade, e não é comprando material que vem de São Paulo, que vem de outros lugares, que eles vão mostrar essa dignidade, essa cultura, que é tão linda, que é tão rica. Muitos artesãos se espelham neles para fazerem os seus trabalhos. E, no entanto, muitos preferem não seguir esse caminho. Não estou dizendo que são todos, porque lá há trabalhos lindos, sim, dos índios, mas alguns preferem outras maneiras de trabalhar. Então, eu, como representante da Comissão Deliberativa do Brique, estou aqui para dizer que estamos apoiando, sim, uma criação de uma área, no estacionamento, só para os índios. Queremos ajudá-los, no que for possível; estamos aí para isso! Várias vezes tentamos conversar, tentamos entrar num diálogo por meio da SMIC, por meio da Câmara de Vereadores para que possamos estar trabalhando juntos em uma mesma área, com dignidade, mostrando o fruto do nosso trabalho, da nossa cultura. Era isso o que eu tinha a dizer. Obrigada. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Nós completamos agora as quinze inscrições, nós aumentamos em cinco o número de falas.

O Sr. Francisco dos Santos, do Morro do Osso, está com a palavra.

 

O SR. FRANCISCO DOS SANTOS: Bom-dia a todos, eu sou do Morro do Osso, eu fico olhando as pessoas falarem sobre os trabalhos indígenas e fico triste, porque nós estamos finalizando a Semana do Índio, que é no mês de abril, e vejo que as pessoas não entendem, a pessoa branca não entende o que nós, indígenas, sentimos dentro de nós. A gente tem muita preocupação; eu me preocupo muito com meus filhos, com a minha comunidade indígena. Na parte artesanal indígena, do Brique da Redenção, onde nós vendemos nossos trabalhos artesanais, muitos acham que nós estamos trabalhando, comercializando as coisas compradas, e, na real, é! Sabem por que é? Nós aqui, eu, indígena, sou nato deste País. Todo este território brasileiro pertence a mim. Existe uma lei que garante o meu direito.

Só que a gente está vendo muitas coisas sendo incluídas, juntas, nessa lei que está sendo criada. Nós não aceitamos; nós já temos a nossa lei. Nós, indígenas, temos uma lei. Só falta ser cumprida. Só falta cumprirem os nossos direitos. O Município cumpriu, o Estado cumpriu.

Os nossos trabalhos artesanais, no passado, eram muito bonitos. A gente trabalhava com sementes, com coisas da própria natureza, mas agora elas não existem mais. E por quê? Porque o Pedro Álvares Cabral chegou aqui ao Brasil, invadiu o País, e acabou com tudo; terminou até com as minhas sementes. E, agora, elas não existem mais aqui na Região Metropolitana.

E, para não esquecer do meu passado, do passado dos meus avós, sou obrigado a comprar as sementes que vêm lá do Mato Grosso, porque, aqui, no meu Sul, não têm mais; elas acabaram. Aqui têm sementes que não são do Sul; são do Amazonas, do Mato Grosso, daquela região, mas eu tenho de comprar para poder fazer o meu trabalho e poder vender. Isso é real.

Vocês têm que entender que quem terminou com tudo, com as nossas frutas, com as nossas sementes, foram vocês próprios!

Depois que deu essa imigração na América do Sul, de outros países, as minhas frutas, as minhas sementes e as minhas raízes começaram a acabar. E agora sou obrigado a comprar para fazer meu artesanato para dizer que sou índio.

Os índios, dentro da história, em 1911, depois que acabaram com os índios, os que escaparam, pegavam parafusos das carroças - os que começaram a derrubar as matas daqui -, pegavam os parafusos e faziam colar para usar. Isso não é de agora que está acontecendo, mas isso é a nossa cultura.

Então, a gente fica triste. Teve um senhor que falou que a gente estava comprando... Mas nós temos de comprar as sementes, porque não tem mais sementes, pois vocês comeram tudo. E não tem mais, não existe mais!

Nós queremos que obedeçam às nossas leis. Nós temos direitos. Porto Alegre está assentada em cima de nove aldeias indígenas. E nós temos direito, sim, mesmo no Centro de Porto Alegre, em qualquer parte da Cidade, nós temos o direito de vender o nosso artesanato. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Registro a presença da Coordenadora de Direitos Humanos da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana, senhora Leila Schaan.

O Sr. Valdomiro Vergueiro, da Comunidade Indígena do Morro do Osso, está com a palavra.

Nós estamos, neste momento, na Audiência Pública que trata do Sistema Municipal de Unidades de Conservação.

 

O SR. VALDOMIRO VERGUEIRO: Bom-dia a todos, meu nome é Valdomiro, sou Cacique do Morro do Osso. Nós estamos aqui reunidos nesta hora da manhã para relembrar do nosso trabalho passado. Relembrar o que nós sempre estamos relembrando: do nosso trabalho e da nossa cultura; nunca nós vamos deixar da nossa cultura.

Mas, pegando o gancho de alguém que falou aqui, que os índios estão terminando com o artesanato, com a cultura deles, é o contrário: o artesanato dos indígenas eles ainda estão fazendo. Mas quando o indígena faz um balaio, ali vem o Poder Público dizendo que no Brique da Redenção não tem espaço para ele trabalhar. Agora, há pouco, um brigadiano e um fiscal da SMIC começaram a dar coices nos balaios dos índios. E daí o que eles vão querer com nós? Como é que nós vamos sobreviver, nós estamos ali trabalhando para sobreviver, para sustentar os nossos filhos.

Quando nós começamos a trabalhar, a comercializar o nosso artesanato, acham que nós não podemos nem mesmo sair nas matas para buscar cipó; eles vão ali e prendem o nosso material. Como é que nós vamos trabalhar? Se um índio vai buscar um material para fazer um trabalho, ele é apreendido. Há muitas suspeitas sobre nós ali no Brique da Redenção, e, nos últimos dias ali aconteceu que os índios não poderiam trabalhar. É como o Francisco falou: terminou a semente, está terminando tudo, o que nós vamos fazer? Do que nós vamos sobreviver? E quando o índio faz um colar, dizem: “Ah, mas o índio está saindo fora da cultura dele”.

Então, por que não vão naqueles empresários que têm aqueles balaios de vime, que estão imitando o trabalho do índio? Por que não fecham as portas daquelas empresas, para depois virem falar do nosso trabalho? Nós não queremos mudar a Lei, a Lei nós já temos, só falta é cumprir a Lei. E o que eu quero colocar nestes poucos minutos é que falta o Poder Público nos respeitar, porque daí nós vamos respeitar eles também. Como é que nós somos ali imprensados, espremidos num lugar, como é que nós vamos trabalhar e sobreviver? Sabemos que, quando o branco fala que quando os indígenas chegaram aqui em Porto Alegre, eles já estavam aqui. É mentira de vocês! É mentira, porque o índio veio primeiro que vocês aqui neste lugar. E não adianta vocês quererem alegar um espaço para nós trabalharmos, porque nós temos direito, sim, por Lei temos direito! Como é que agora o Poder Público pode chegar e dizer: ”Os índios não podem trabalhar”. Claro que podem! O que vocês querem que os índios façam? Que vão bater carteira das pessoas pelas ruas? Nós trabalhamos para poder sobreviver. Nós não andamos batendo carteira de ninguém para sobreviver. Nós trabalhamos, nós lutamos para que possamos viver com a nossa família, com as comunidades indígenas.

Então, muitas vezes nós sofremos preconceito. Até mesmo nos últimos dias teve uma pessoa dizendo que os índios tinham de enfrentar tumulto. Tumulto para quê? Eu já aprendi a viver. Aprendi a Lei. Eu não quero fazer tumulto. Eu disse que nós tínhamos que fazer uma reunião para tratar sobre o Brique da Redenção, e não só do Brique da Redenção como da Praça da Alfândega também. Acho que está na hora de o Poder Público saber colocar as coisas no lugar, saber que o indígena tem direito, sim.

Agora, há pouco tempo, esteve um Vereador também chamando os índios do Morro do Osso de gigolôs. Aonde é que está o respeito pelos índios? Aonde é que estão estas pessoas que respeitam os índios? Eles têm de respeitar para que sejam respeitados! Acho que nós temos de terminar com estes preconceitos que se levantam, porque nós somos iguais para iguais. Eu quero agradecer, agora, mas é muito pouco este tempo para nós. Se nós fôssemos mesmo contar os nossos direitos, nós levaríamos uns dois, três dias. Meu muito obrigado. (sic)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Eli Fidelis, do Grupo Caingangue da Vila Safira, Morro Santana.

 

O SR. ELI FIDELIS: Bom, sou Eli Fidelis, como já foi anunciado pela Mesa, quero dar meu bom-dia a todas as pessoas que estão fazendo parte desta Audiência Pública. São apenas cinco minutos para a gente tentar fazer alguma coisa. Na verdade, esta Audiência Pública poderia se estender pelo dia inteiro para que todos pudessem chegar a uma conclusão e entender o que vem acontecendo. Percebi que, no nosso País, há um pedido de mais de 20 anos por uma luta pela democracia. Do meu ponto de vista, falta muito para a tal democracia acontecer de verdade, porque entendo que a gente, com pequena luta, ou com muita luta, vem conseguindo pequenos espaços dentro desta Cidade. Muitas pessoas acham que a Cidade está dando, está oferecendo, está fazendo um favor, está prestando um favor para nós. Na verdade, não é isso, são pessoas que não têm um mínimo de entendimento sobre a nossa luta. Nós entendemos que Porto Alegre foi um território que perdemos na guerra, porque as nossas terras, na prática, foram roubadas. Mas, pouco a pouco, estamos aí, nos estendendo novamente para uma guerra, para resgatar tudo aquilo que perdemos.

As pessoas entendem que - como o companheiro comentou há poucos minutos aqui - temos que trabalhar com aquilo que alguma entidade, alguma associação entende que temos que trabalhar, não da forma como queremos. As pessoas não entendem ou não enxergam quando alguém está comercializando um artesanato indígena? Eu queria que qualquer instituição, qualquer indústria e comércio me apresentassem uma denúncia de um indígena que foi procurar o Poder Público para denunciar que lá existe alguém comercializando um artesanato indígena. Então, no meu ponto de vista, quem vem ambicionando o que é do outro, esta pessoa, para mim, não trabalha. Para mim, ele não trabalha, porque jamais algum caingangue, algum guarani, algum charrua chegou no Poder Público para denunciar alguém que estava trabalhando. E nós temos uma luta muito longa ainda. Há quanto tempo nós estamos comercializando, mas, no entender de algumas pessoas, claro, pode ser comercializado, porque dentro das lojas está o nosso material de trabalho que eles podem comercializar. Por que nós não podemos explorar, também, se nós já fomos explorados? Quando nos exploraram, isso ninguém veio aqui comentar, ninguém veio aqui falar. Tudo que é ilegal na cidade ninguém comenta, e muitos estão querendo nos levar como pessoas ilegais. Na prática, não é isso. Nós queremos garantir o nosso direito, com dignidade, sim. E todos nós estamos trabalhando com dignidade. Nós não estamos batendo carteira e jamais pedimos alguma coisa para alguém ou roubando alguém. Agora, se alguém pode trabalhar, alguém pode vender, alguém tem direito, por que não entendem? Muitos entendem que nós não temos direito. Muito obrigado, desculpem alguma coisa que eu falei errado. (Palmas.) (sic)

 

(O Ver. Pedro Ruas assume a presidência dos trabalhos.)

 

O SR. PRESIDENTE (Pedro Ruas): Eu chamo para usar a tribuna o Sr. Arno Cláudio Trapp, do Conselho Construtivo do Parque Natural Morro do Osso.

 

O SR. ARNO CLÁUDIO TRAPP: Moro em Porto Alegre há praticamente 50 anos. Venho do Interior, de um lugar onde havia índios guaranis, na área de São Miguel das Missões, e convivi em outras áreas em que havia matas naturais, onde existiam veados, cobras, e a razão da minha presença aqui é a preocupação com a preservação do meio ambiente. O que se vê no Brasil inteiro, particularmente em Porto Alegre e em outras grandes cidades, é o desprezo pelo meio ambiente. Em Porto Alegre, nós só temos poucos parques naturais, poucas áreas de conservação da natureza. Alguns deles, como o do Parque Natural Morro do Osso, foram criados pela luta da sociedade, de professores, colégios e outras entidades preocupadas com a preservação. Estão lá, sujeitos a muitas pressões do meio ambiente.

Nas visitas que tenho feito em outras áreas, parques do Brasil, o que sempre ouço é o seguinte: “Não deixe aqui o que não trouxe, não leve daqui - além do que trouxe - outras coisas que não sejam fotografias e lembranças”. Isso eu acho que é aplicável a todas as unidades de conservação que temos em Porto Alegre. Na área do Parque Natural Morro do Osso, que tenho visitado, não só eu, como os outros, outras pessoas que moram lá, o que notamos é uma gradativa remoção de coisas naturais de lá, como cipós. Achamos, acho eu, pelo menos, que, se quisermos uma renovação da Mata Atlântica - para nós, porto-alegrenses, brasileiros e toda a população -, nós devemos retirar das nossas matas, sim, árvores exóticas, plantas que não são daqui e deixar lá o que é daqui, o que cresceu aqui, e somente isso: restaurar a mata, restaurar a vida, não é tirar a vida. Essa é a minha manifestação. Obrigado e defendamos as nossas unidades de conservação a todo custo contra todo e qualquer tipo de agressão.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Jaime Kaingangue, da Lomba do Pinheiro, está com a palavra.

 

O SR. JAIME ALVES: Há muito tempo a gente vê essas críticas contra o povo indígena. Falando em conservação ambiental, isso para nós está bem claro. Como é que existe uma conservação ambiental se não há o homem cuidando dela? E esse homem... Nós já somos natos, para começar, então quem tem que cuidar... Hoje, quando o senhor fala do Parque Natural Morro do Osso, fui eu que movimentei, porque para mim não tinha legitimidade. Para mim, o Parque do Morro do Osso é uma praça com 27 hectares de conservação ambiental. Mas, o entorno do Parque, será que tem gente protegendo? Quando nós ocupamos aquela área era tudo um matagal, tudo queimado. Isso nós comprovamos aqui, para o Ministério Público defender também os nossos direitos. Quanto ao Plano Diretor, o que eles querem? Não querem conservação ambiental. Para mim, é interesse que o Plano Diretor tem, porque é nisso que o povo não indígena tinha interesse com o descobrimento do Brasil. Por isso que hoje eu estou aqui. Há 17 anos eu convivo com a sociedade não indígena, e, quando em 1911 foi demarcada a área, nós já sabíamos que um dia ia acontecer isso. A cidade de Porto Alegre, se não me foge à memória, tem 300 anos, e nós existimos há 14 mil anos antes de Cristo. Vejam bem qual é o direito desses povos. E hoje, por incrível que eu vejo, nós não estamos sendo protegidos. Sim, somos protegidos! A Lei, para mim, está clara; o art. 225, para mim, está claro. A Lei, quando ela é feita - é uma Constituição Federal -, tem que ser respeitada também para os povos indígenas.

Então, o que é que a sociedade de Porto Alegre quer, quando se trata dos políticos, por aí, dizendo: “Vamos fazer inclusão social”? Será que é assim que vocês querem inclusão social? Nós é que fizemos a inclusão social, porque nós queremos viver junto com vocês. Então, eu acho que está na hora de começarmos, juntos, a preservar a vida de qualquer cidadão, porque o nosso Brasil trouxe bastantes etnias, e o nosso Governo sempre deu garantia para qualquer etnia. Por isso, hoje, eu vejo na minha frente um tormento que amanhã ou depois ainda nós teremos que passar. Mas nós estamos aqui dizendo para vocês que não é assim que se trata de um ser humano, quando se trata de conservação ambiental. Meu muito obrigado. (sic) (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Quero anunciar a presença do Ver. Reginaldo Pujol, Líder do Democratas; e do assessor da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos, Dr. Bittencourt, que representa a Verª Juliana Brizola.

O Cacique Cirilo, da tribo guarani, da Lomba do Pinheiro, está com a palavra.

 

O SR. JOSÉ CIRILO PIRES MORINICO (Cacique Cirilo): Bom-dia. Eu sou povo guarani, eu represento o povo guarani. A gente está muito preocupado com o ambiental. Claro que a gente entende como resolver, só que é muito recente, não dá para discutir e aprofundar junto com os guaranis, porque precisamos ter mais espaço para a gente discutir sobre esse território dos índios. Nós temos que respeitar cada um de nós estar aqui, que os parentes caingangues antes falavam tudo isso; não podemos falar diferente porque nós, os caingangues e os guaranis, vivemos juntos. Na verdade, aqui na Praça Alfândega, aqui na nossa América Latina tem cerâmica guarani, então, como é que a gente não vê esta parte? A gente não tem vergonha de dizer que nós somos donos da terra. Agora, como é que o índio não pode vender artesanato no Brique? O índio também tem direito de vender.

Por exemplo, o índio não pode tirar taquara, porque ambientalista proíbe; como vamos produzir nossa sustentabilidade? Donde vamos tirar? A taquara está proibida, a madeira está proibida. Como vamos sustentar nossa família? Nós temos que pensar sobre isso, a sociedade responsável tem que olhar para os índios, dar exemplo para nosso filho de como se vai viver. Hoje, cada vez mais, os índios vão apertando, tirando riqueza natural que já foi tirado; hoje temos que crescer, e cada vez tiram nossas raízes. Hoje os guaranis querem viver sua cultura, seu ritual; lá no Morro São Pedro tem cerâmica guarani comprovada. Como hoje vão proibir nosso espaço onde nosso filho aprendeu a fazer armadilha para pegar tatu? Claro, a gente sabe a época, como lidar com tatu, porque na época da criação ... A gente sabe, para cortar taquara, a gente sabe a lua; a gente sabe sobre ambientalismo, que momento podemos tirar a madeira. Nós temos que rezar para tirar, para cortar taquara, rezar; a gente sabe respeitar a natureza, porque a natureza é nossa vida, a terra que alimenta nós. Como é que nós vivemos assim, com pequenas áreas? Hoje nós queremos sustentabilidade com grande espaço, nós queremos espaço para trabalhar, para fazer ritual, para fazer artesanato, para fazer lavoro. E hoje o índio não tem espaço; hoje, para estar na cidade, você tem que usar roupa, até com isso nós sofremos discriminação. A legislação não permite, se o índio fica pelado lá, que é que vai ser? Não vai ser índio, vai ser um louco, então, é isso que nós queremos aqui hoje. Nós temos que se arrumar, porque não tem índio só na Amazônia. O índio está aqui. Nós temos que aprender a usar sapato, para poder viver na cidade, entrar. Obrigado. (sic). (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Quero anunciar a presença dos Vers. Carlos Comassetto, Ervino Besson e João Pancinha, que nos honram com as suas presenças nesta Audiência Pública que discute o Sistema Municipal de Unidades de Conservação.

O Sr. Ruben Marques Pacheco, artesão-cuteleiro, está com a palavra.

 

O SR. RUBEN MARQUES PACHECO: Eu sou Pacheco, artesão-cuteleiro, eu vim a esta Audiência, respeito a Mesa e respeito os nossos nativos. Só temos uma coisa a dizer: onde está, na história, a prataria, a metalaria junto dos nativos? Esse é o ponto a que nós, da Feira do Bom Fim, nos atemos. Não é que sejamos contra eles estarem conosco nessa Feira, mas, sim, o material que eles estão apresentando. Isso, o Poder Federal, os senhores que vêm defendê-los, ponham em suas mentes que é esse material, é esse o ponto a que nos referimos, não é a presença deles, com o seu produto. Nós respeitamos o produto deles. Agora, não venham trazer materiais importados, industrializados, a não ser que se saiba de alguma escola de prataria e ourivesaria dentro de alguma tribo brasileira. Se houver, eu agradeço muito que alguém me diga onde está essa escola, e eu vou felicitar esse povo tão respeitoso, os nossos nativos. A prataria, onde está a escola de prataria? Eu sei que lá fora tem, lá fora está cheio; agora, no Brasil, não tem. Se vocês apresentarem, aí nós vamos respeitar esse trabalho de vocês. Naquele material que está sendo apresentado, a prataria que está lá e outras coisas também, tem muito plástico misturado. Então, isso já é industrialização. E nessa industrialização é que nós nos debatemos, não é no trabalho nativo, o trabalho nativo nós respeitamos. Eu quero saber onde é que está essa escola. Espero que o Poder Público Federal, o Estadual e o Municipal tratem de olhar este ponto, este ponto é que é o cruciante do nosso debater sobre a presença deles junto a nós, porque eles estão atravessando, e com produto de homem branco, não com o trabalho deles. É esse o ponto que nós temos a defender. Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Todos têm direito a falar, como já foi colocado, e nós vamos garantir a palavra para todos. Falará, agora, a Srª Adelaide Canozzi, do Brique da Redenção.

 

A SRA. ADELAIDE CANOZZI: Bom-dia a todos os presentes, eu gostaria de iniciar aqui representando, também, os artesãos do Brique da Redenção. Gostaria de iniciar, reproduzindo uma frase da fala do Sr. Promotor, que diz que os índios vêm para comercializar os seus produtos de artesanato. Então, realmente, todos os colegas já falaram, esse é o ponto. Nós estamos, assim, com muita dificuldade de aceitar esses produtos industrializados, que são Hello Kitty, que são produtos de metal, de fundição de grandes indústrias, de grandes empresas.

Nós vemos que, quando os índios colocam realmente os seus produtos, de toda a natureza, cestarias, objetos, é tudo muito bonito, e os turistas gostam muito. Nós mesmos, ali, somos consumidores dos produtos de vocês.

Gostaria, também, de elogiar aqui os caciques que estão com esses cocares lindos. Não vejo nunca vocês, lá no Brique, com esses cocares. E gostaria de falar também que nós aqui estamos nos atendo à questão do artesanato, mas a cultura indígena tem muitos outros aspectos a serem salientados. Nós temos também a cultura imaterial dos povos indígenas, que são as danças, os rituais, a própria linguagem, os próprios idiomas. O idioma indígena é muito interessante. Quando nós vemos as crianças, os adultos, conversando no idioma de origem, isso chama muito a atenção.

Então, eu acho que o espaço do Brique é um espaço muito rico, e tem espaço para se fazer muitas atividades. Nós temos também indígenas de outros países aqui da América do Sul que estão lá cantando e dançando e chamam muito a atenção. Então, eu acho que os índios têm um potencial muito grande. Nós estamos falando só na questão do artesanato, que é o problema que nós estamos tendo lá no Brique, mas na verdade existem muitas culturas, muitas outras formas de expressar a cultura indígena que precisam ser valorizadas. Os indígenas precisam estar no Brique, devem estar no Brique da Redenção, mas mostrando aquilo que eles têm de melhor e não aquilo que é o que de menos bom eles têm, que é estarem comercializando produtos que não são da sua cultura. Acho que ficou bem claro aqui que vários dos representantes indígenas que falaram afirmaram que realmente estão transgredindo, que realmente estão vendendo produtos que eles compram. Nós gostaríamos de sugerir e de reafirmar que nós não somos contra, que nós queremos o caminho da conciliação, que nós queremos um espaço em que possamos viver em harmonia e que possa ser produtivo para todos. Nós, do Brique da Redenção, cumprimos regras também, nós não podemos chegar lá e botar qualquer produto que a gente queira produzir; a gente coloca aquele produto que está autorizado, que passou por uma triagem, e nós queremos que os índios também estejam lá cumprindo com regras que tragam harmonia para aquele conjunto de interesses. Obrigada. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Professor Antonio Ruas, do curso de Gestão Ambiental da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul - UERGS - está com a palavra.

 

O SR. ANTONIO RUAS: Bom-dia a todos! Sr. Presidente, eu gostaria de agradecer esta oportunidade e cumprimentar em especial as lideranças indígenas e os demais companheiros indígenas presentes aqui nesta Audiência, demais autoridades e dizer que também represento, neste momento, o Núcleo de Educação e Saúde Indígena da Escola de Saúde Pública e o Movimento Ecológico Popular, que se debruçou sobre a questão da SMUC e tem feito uma análise bastante aprofundada dessa questão.

Vou começar dizendo para vocês que eu acho que é nossa obrigação vir a esta Audiência Pública, Sr. Presidente, e manifestar inicialmente o nosso reconhecimento e a nossa solidariedade com a luta indígena, com a causa indígena, que vem, como já foi falado aqui para alguns companheiros, de cinco séculos ou mais, e que se expressa hoje no Brasil principalmente por uma luta pela sobrevivência dessas populações indígenas. E essa é uma mesma causa em todo o Brasil: na luta lá pela demarcação da Raposa Serra do Sol, em Roraima, e por todos os lados neste nosso Brasil onde a gente vê, na verdade, essas populações como nossas aliadas na luta pela preservação dos nossos recursos naturais, que vêm sendo pilhados. Não podemos nos iludir nesse aspecto, nós sofremos um processo de devastação violento, haja vista até o avanço das nossas fronteiras, como vocês devem ter observado aqui, na tentativa de liquidar com a proteção das fronteiras para favorecer as madeireiras. A gente viu isso aqui no Rio Grande do Sul. E essa tentativa de burlar a lei continua andando. Como é que nós vamos parar isso, pessoal? A gente vê em Porto Alegre situação semelhante.

É preciso reconhecer a importância desses povos indígenas, em Porto Alegre, e hoje são representados por três etnias: a caingangue, a guarani e a charrua, que recentemente foram bastante esclarecidos com relação a sua presença em Porto Alegre, através de um estudo da FASC, que demonstrou, Sr. Presidente, que nós temos praticamente 700 indígenas em Porto Alegre. Precisamos, na verdade, reconhecer o direito desses povos, que não vêm sendo aplicados.

O companheiro Jaime falou da questão da Constituição Brasileira. Nós temos na própria Lei Orgânica do Município direitos indígenas que não vêm sendo assegurados. Então, inicialmente a gente precisa colocar a nossa reivindicação: que seja reconhecida a importância indígena em todas as esferas do seu interesse. Nós tratamos aqui agora da questão das Unidades de Conservação e nós vemos inicialmente a ausência indígena nos Conselhos que regem as Unidades de Conservação. Foi falado aqui no Conselho Gestor do Morro do Osso, mas não há a presença indígena nesse Conselho. Temos que ter. Não temos presença indígena no Conselho Municipal do Meio Ambiente. Nós precisamos ter a presença indígena para discutir o seu interesse e utilizarmos, no bom sentido, a experiência desses povos na conservação do que ainda resta em Porto Alegre, que é a mesma situação do resto do Brasil.

Nós vemos nesse plano das unidades de conservação alguns avanços, mas temos que melhorar muito. Precisamos, inicialmente, reconhecer a importância, Sr. Presidente, de incluir a presença indígena na discussão das unidades de conservação. E precisamos ampliar essa discussão para ampliar o número de unidades de conservação e criar, por exemplo, a unidade de conservação do Morro São Pedro, do Morro Santana, já pensando no processo de sustentabilidade indígena, e precisamos, enfim, avançar na presença indígena em toda essa questão.

Para finalizar, nos preocupa, por exemplo, a questão da possibilidade das unidades de conservação serem geridas por OSCIPs. Não podemos permitir isso. Essas unidades têm que ser geridas pela comunidade, incluindo os representantes indígenas. Só assim a gente vai conseguir preservar o que ainda resta em Porto Alegre.

Várias outras questões que a gente viu nesse SMUC precisam ser bastante detalhadas, para que a gente possa ter, Sr. Presidente, um processo de avanço em relação às nossas unidades de conservação. Além disso, foi mencionada a questão do Morro do Osso, precisamos chamar a comunidade indígena que está presente lá, entender a importância da sua presença, e garantir que o entorno daquela unidade, e das outras entidades, também sejam áreas de preservação para uso sustentável. Para isso, a gente vai contar, fundamentalmente, com a colaboração das comunidades indígenas. Obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Obrigado, Profº Antonio Ruas. O Sr. Ari Ribeiro, do Movimento Indígena Lomba do Pinheiro, está com a palavra.

 

O SR. ARI RIBEIRO: Quero saudar o Ver. Adeli, todos os Vereadores, a plateia presente, os caciques que representam suas comunidades. Primeiramente, quanto à questão da criação das unidades de conservação, os povos indígenas, na realidade, têm pouca noção de que isso irá nos afetar futuramente. Dentro das comunidades, temos pessoas com condições suficientes para, juntamente com a sociedade civil organizada, participar da construção desse processo.

Nós, vendo todos os usuários do palanque, gostaríamos de lembrar também de um foco mais direcionado ao Morro do Osso, e não podemos esquecer de referir que os parques, no entorno de Porto Alegre, estão sendo muito degradados; não pelos povos indígenas, mas por construções imobiliárias. Eu acho que isso deveria ser observado, e nós, povos indígenas, nos preocupamos muito com isso, porque faz parte da nossa sobrevivência, inclusive da sustentabilidade, questão com a qual a gente trabalha muito - não é uma palavra indígena, porque os nossos antepassados não precisavam de sustentabilidade, existia abundância, e isso hoje está nos preocupando muito.

A sociedade organizada do Brique da Redenção vem nos contestar sobre produtos, mas, hoje, nós, indígenas, estamos trabalhando numa questão não mais de produtos da cultura; nós estamos trabalhando com produtos de bens dos povos indígenas. O que se trabalha lá não é um produto de roubo, não é um produto pirateado, como vemos por aí, todos os dias, essas coisas; é um produto para sobrevivência. Então, são bens dos povos indígenas, são bens que eles estão fazendo uso para sua sobrevivência.

A sociedade organizada deveria abraçar essa questão, discutir essa problemática em si, evitando principalmente os conflitos que já têm acontecido. Eu acho que isso é uma vergonha para toda a sociedade, é uma vergonha inclusive para o próprio Município, que nos presta uma assistência mínima; os Srs. Vereadores deveriam cobrar mais do Poder Público Municipal, a partir do seu Executivo.

A pesquisa apresenta 700 índios, isso em termos de cadastramento, mas se for contar todos os indígenas que moram em Porto Alegre e na Grande Porto Alegre, serão quase milhões também. Então, o Poder Público Municipal está fazendo muito pouco pelos povos indígenas. Isso vai acarretar esses conflitos que vêm acontecendo com a sociedade civil organizada. Hoje, temos a Funai e a Funasa, que nos assistenciam. Mas nós, povos indígenas, continuaremos na Cidade, e a multiplicação desses povos indígenas será, no futuro, mais complicadora para o Poder Público. Portanto, deixo ao Poder Público, aos Srs. Vereadores, a informação de que os povos indígenas continuarão sempre nesta Cidade. Muito obrigado. (Palmas.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Jorge Senna, da Articulação Nacional de Educação Popular e Práticas em Saúde, está com a palavra.

 

O SR. JORGE SENNA: Acompanhando este debate, esta Audiência, eu vejo que a gente tem que pensar a Cidade dentro dessa diversidade. Preocupa-me muito, também, que setores do Brique queiram determinar qual o tipo de material que uma comunidade vai usar para produzir o seu bem. Eu lembro que, no processo histórico da população negra neste País, nos falaram também qual o tipo de prática religiosa que nós tínhamos que manter e como manter. Então, vejo que devemos refletir, para o bom convívio desta sociedade, sobre o respeito ao direito de cada população exercer sua função e como ela pode exercer. A gente não pode determinar, através do próprio Sistema Municipal da Unidade de Conservação, o tipo de material a ser usado por uma comunidade para exercer a sua função, ou restringir o seu uso. Qual é a alternativa que é dada a essa comunidade para poder trabalhar? As populações indígena e negra deste País foram muito desapropriadas de suas culturas. Se nós analisarmos, o próprio território do Bom Fim, que era uma colônia africana, hoje é considerado colônia judaica. A gente sabe muito bem por meio de qual processo passamos e onde formos parar. Sabemos por que eles estão na Lomba do Pinheiro, na Safira; sabemos por que a maior parte da população negra está nos morros e vivendo também nessas áreas fora do centro da Cidade? Se nós analisarmos, na região de Ipanema, grandes condomínios estão existindo. Observem as cercanias do Morro do Osso, os grandes condomínios que tem lá. E qual é a posição desse setor da sociedade quando esses grandes condomínios crescerem? Hoje os índios recorrem a sementes de outros Estados, como o outro representante disse, porque não existem mais aqui, porque nós mesmos acabamos com elas. Então eu acho que a gente tem que refletir, nesse processo de construção - até cópia do Sistema Municipal da Unidade de Conservação -, como nós vamos articular que essa comunidade, que depende também desses espaços, possa - através de um sistema de manejo - retirar e manter também a sua matéria-prima. Depois, sim, poderemos cobrar qual será o tipo de material. Se nós formos analisar qual é o tipo de material que entra industrializado, a gente também tem que analisar qual é o tipo de material que os artesãos do Brique usam para poder manter também a sua venda ali. Então eu acho que é um pouco autoritário nós determinarmos para a comunidade qual o tipo de material que eles vão usar. Então, eu acho que a gente não tem que se prender só ao tipo de material que eles usam, mas também como nós vamos trabalhar a produção de matéria-prima nesses espaços dessas unidades de conservação. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Passo a palavra ao Sr. Renato Farias, Presidente da Associação dos Moradores da Otto Ernest Meyer - Amotem.

 

O SR. RENATO FARIAS DOS SANTOS: Bom-dia, eu cumprimento os caciques presentes, as lideranças indígenas, os Vereadores, as autoridades aqui representantes das diversas Secretarias e todos os presentes. Quando a gente fala da questão indígena, muitas vezes a gente não tem uma noção do que se está falando. Grande parte da população não sabe o número de aldeias que nós temos hoje vivendo aqui. Hoje temos guaranis na Lomba do Pinheiro, Cantagalo, Lami, nas áreas próximas também de Itapuã; há caingangues na Lomba do Pinheiro, Morro do Osso, área da Safira, Morro Santana, Jari, Jardim Protásio Alves, toda uma enorme quantidade.

Nós tivemos agora recentemente um trabalho muito importante, que foi esse da FASC, e cumprimento-os pela pesquisa junto com a UFRGS, onde é mostrada um pouco dessa realidade. E ali mostra claro que a principal alternativa de sobrevivência da população indígena tem sido o artesanato. Mostra que em torno de 90% dos caingangues sobrevivem do artesanato; 76%, se não me engano, dos guaranis também; e também uma grande quantidade dos charruas, eu havia me esquecido de falar, na Lomba do Pinheiro. Então esse é um dos pontos principais que têm que ser pensado: a sobrevivência das comunidades indígenas hoje está alicerçada na questão do artesanato. Aonde buscar esse material? Nós tivemos uma depredação enorme aqui em Porto Alegre. Quando a companheira artesã falou que mora aos pés do Morro São Pedro, eu me lembrei que eu também me criei e vivi a maior parte da minha vida aos pés do Morro Santana, e a depredação que a gente viu ali não foi feita pelos índios; foi feita pelos brancos, começando por aquela pedreira dos Asmuz, começando pelas comunidades que foram subindo cada vez mais aquele morro. Há pouco, o jornal Zero Hora mostrava o Morro do Osso e mostrava a foto de uma caixa-d’água enorme depredada em volta, como se aquilo fosse para os índios. Na verdade, aquela caixa d’água era das mansões. E quem destruiu o Morro do Osso não foram os caingangues que hoje estão lá.

Eu tive a oportunidade de ir lá, várias vezes, fui lá no sábado, numa festa tradicional, e a gente vê como está preservado na volta da aldeia. O Cacique Cirilo falou muito claro: “Os índios cuidam”. Quando tiram um cipó, eles sabem o tempo que aquele cipó leva para crescer novamente. Tem um trabalho belíssimo, feito pela Ana Freitas, que há pouco estava na Secretaria de Direitos Humanos, que fala sobre o cipó. É bom a gente ler para saber realmente como é que isso funciona. E toda a sua história, tanto o artesanato quanto a busca de chás, de ervas, os costumes estão ligados a isso. Então, o acesso às áreas nativas, às matas, é importantíssimo para os índios. Agora, por exemplo, o próprio Plano Minha Casa, Minha Vida tem que se preocupar, na realidade, com as comunidades que estão na área de risco. Olhem o Morro Santana, a Vila das Laranjeiras e outros, subindo o morro. Aquilo não existia. O Morro está sendo destruído por loteamentos e ocupações. Na realidade, nós temos que nos preocupar com isso.

O Município e o Poder Público têm que ser propositivo. Se há alguns problemas com relação ao artesanato, o que está sendo feito para dar alternativas para os índios? Algumas iniciativas a gente cumprimenta. Cumprimenta a Escola de Porto Alegre, que está resgatando a cerâmica; a gente cumprimenta a SMIC, através da Emater, que está atuando na questão da agricultura; a Secretaria dos Direitos Humanos, que está fazendo um trabalho excelente. Mas a Prefeitura tem que deixar de achar que ela só tem que fazer papel de polícia. A SMIC e as diversas Secretarias têm que propor alternativas, têm que ser parceiras, fazendo com que o índio possa ter o seu sustento, pensando as situações. Eu não poderia deixar de lembrar da Secretaria de Saúde: não se decidiu ainda sobre o agente de saúde para o Morro do Osso, que já tem verba da Funasa há tanto tempo, porque não tem um PSF próximo. Não se pode negociar isso com outro PSF?

Então, há uma série de coisas, e a gente não pode pensar só nesse papel de proibir, mas de propor alternativas, trabalhar junto na questão do artesanato, trabalhar junto na questão da agricultura. A SMAM deve trabalhar junto para conseguir que a gente tenha aqui o material que o índio necessita. A gente vê, por exemplo, nas aldeias, como no Canta Galo, e como na Lomba, os índios plantando o Pau-leiteiro, que faz o bichinho. Isso pode ser trabalhado pelas próprias secretarias, propositivamente, mas não agindo como polícia, querendo impedir.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Vherá Poty, Cacique do Canta Galo, do Lami, está com a palavra.

 

O SR. VHERÁ POTY: Bom-dia a todos, eu vou falar pouco, porque eu estou gripado. Eu me obriguei a falar, porque eu quero reforçar um pouco o que os meus parentes falaram aqui a respeito do nosso costume com a nossa natureza. Eu só queria reforçar as questões a respeito da natureza, dos territórios que a gente hoje tem, mas primeiro eu queria começar com uma pergunta para todos: eu queria saber, na verdade, qual foi o valor que a gente recebeu por este território, que é Porto Alegre? A minha pergunta seria esta: qual é o valor que a gente recebeu dos povos não índios, para a terra ser tomada de nós?

Na verdade, eu queria só reforçar o trabalho que a gente faz. Muitas pessoas já falaram aqui sobre qual é a dificuldade para trabalhar com o nosso artesanato, hoje; qual é a situação que impede a gente de fazer coisas que fazem parte da nossa cultura. Todo o tipo de artesanato que a gente faz vem da natureza, das árvores, de sementes. Teve uma pessoa aqui que perguntou de onde vêm os objetos, onde é que está o mercado? Na verdade, o colega já falou muito bem a respeito disso. Mas eu queria comentar um pouquinho sobre as peças indígenas que são pirateadas. Por exemplo, a cuia. A cuia é nossa, e o povo não índio também está fazendo para vender. E por que a gente não pode vender as coisas que eles vendem? A gente não está cobrando nada disso. A gente não está pedindo nada, a gente não está proibindo que vendam coisas que são copiadas de nós. E por que a gente vem aqui para escutar isso? Sei que isso não machuca, não fere nada por dentro de nós.

Mas eu queria dizer que o território que hoje nós estamos querendo e que estamos ocupando também é importante para a nossa sobrevivência. É de lá que vem o artesanato para a venda no Brique da Redenção. O espaço ali para não índio é gratuito, tanto que eles estão lá. Não é a gente que está cobrando ali o pessoal que está vendendo no Brique, a gente só está acompanhando como segundo usuário, enquanto, na verdade, a gente é o primeiro usuário daquele lugar. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Dezesseis senhoras e senhores se manifestaram livres, democraticamente, sem censura, como são as Audiências Públicas. Audiência Pública é uma ouvida, e encaminhamentos podem ser sugeridos. Não só as falas, mas como as sugestões que foram feitas estão registradas pelas notas taquigráficas e serão, por solicitação minha, como Presidente desta Audiência Pública, colocadas, apensadas ao processo. Ao final, se algumas pessoas quiserem discutir, inclusive, formas de acompanhar as várias emendas ou o processo, vamos verificar a forma de fazê-lo. Os Srs. Vereadores e as Sras Vereadoras que quiserem fazer o uso da palavra poderão fazê-lo neste momento.

O Ver. Engenheiro Comassetto está com a palavra.

 

O SR. ENGENHEIRO COMASSETTO: Bom-dia a todos! Cumprimentando o Ver. Adeli Sell, presidindo os trabalhos, cumprimento as representações do Município, do Estado, da União, da sociedade civil, as comunidades Caingangues, Charrua e Guarani aqui presentes; quero dizer que também venho aqui para fazer uma prestação de contas do papel deste Legislativo e do trabalho que realizamos nos últimos quatro anos e meio, cinco anos, referente à cultura indígena em Porto Alegre.

Esta Audiência Pública é a primeira desta Legislatura, mas entendemos que é uma continuidade de um trabalho e de um processo que já está instalado. A primeira reunião, que tivemos a grande satisfação de ajudar a coordenar e a constituir, quando pela primeira vez estiveram aqui, para tratar do tema indígena, dois Senadores da República, Zambiasi e o Paim, nós conseguimos - um trabalho desta Câmara, com a Comissão de Direitos Humanos desta Casa, com a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e a Funai - resgatar o reconhecimento dos povos indígenas Charruas, que voltaram a ser autorreconhecidos e reconhecidos nesse processo. Portanto, esse foi o primeiro tema. Depois, realizamos mais três Audiências Públicas, em que trabalhamos aqui algumas garantias, porque, na verdade, nós temos que nos reportar à nossa Lei Orgânica Municipal, que tem um capítulo todo que trata exclusivamente dos povos indígenas. E nesse capítulo da Lei Orgânica do Município de Porto Alegre, que é a nossa Constituição Municipal, já está garantido o direito e o acesso à terra; está garantido o direito e o acesso a participar das atividades de sobrevivência econômica; está garantido o direito aos serviços de assistência social. Isso está inserido no capítulo exclusivo dos povos indígenas, dentro da Lei Orgânica do Município.

E aqui nesta Casa nós produzimos, em 2008, quatro grandes eixos, que deveriam ser trabalhados, e que estão sob a responsabilidade do Executivo Municipal, que ficou de trazer um retorno, e até o momento não temos esse retorno efetivo. O primeiro deles, e aqui eu tenho que ilustrar isso com alguns fatos históricos que são trabalhados e foram ditos nos últimos tempos. Tem esse trabalho da Ana, que já foi citado aqui, que é o dossiê de sustentabilidade indígena em Porto Alegre, um trabalho muito bem-feito, um trabalho muito bem-elaborado, muito bem-produzido, que, em dia 19 de abril de 2007, saiu uma notícia amplamente divulgada na imprensa e que está aqui no nosso dossiê, de que a SMAM prendeu os indígenas que retiravam cipós para a sua sobrevivência em Porto Alegre. Isso no dia 19 de abril de 2007, Dia do Índio, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente de nossa Cidade, contrariando a Lei Orgânica, prendeu indígenas que retiravam cipós. E essa polêmica não foi resolvida até o momento, porque não temos ainda as unidades de conservação e não temos, muito menos, a possibilidade de isso ser utilizado. Portanto, Ver. Adeli, esse é um dos temas. O primeiro tema: se queremos trabalhar a sustentabilidade e a possibilidade de utilizar os materiais que existem em nossa Cidade, ainda dos nossos recursos naturais, nós temos que trabalhar para que a Lei Orgânica se traduza numa questão prática - não só na teoria, mas na prática.

O segundo ponto que está no documento entregue é a questão do comércio. E aqui, pessoal, não vamos fazer uma falsa polêmica: todos têm o direito de utilizar os espaços públicos para comercializar os seus produtos. Quem é que tem que fazer o regramento disso? O Executivo Municipal. Não podemos entrar aqui numa luta de trabalhadores contra trabalhadores. Eu acho que é um equívoco entrarmos nessa possibilidade. Quem tem que regrar isso é o Executivo Municipal: ver os espaços que há, como fazer, como não fazer, e determinar isso sob o ponto de vista inclusive de seus produtos.

Eu aqui quero emitir uma opinião própria: os povos indígenas não são exclusivamente de Porto Alegre; são latino-americanos, e conheço, sim, os incas e os maias, que produzem prataria. Por que não pode haver um intercâmbio dessa comercialização? Não quero entrar no mérito, mas só quero mencionar aqui, como conheço o trabalho do nosso excelente artesão, um intercâmbio entre os povos indígenas. Isso é possível ou não é possível? Acredito que seja possível.

Um outro ponto de que tratamos é a questão do ir e vir, a questão do passe livre que os indígenas reivindicavam também, que está colocada nesse documento, bem como o Projeto de Lei que viabiliza aqui a questão da utilização dessas áreas todas no Município de Porto Alegre, porque tem uma outra grande polêmica estabelecida aqui que se chama, Ver. Pujol, de questão da propriedade. A nossa Constituição Brasileira determina um limite na questão da propriedade. Esses morros todos são, entre aspas, de propriedade privada; alguns são públicos, como é a UFRGS. Bom, como é que trabalhamos esse tema? Temos que enfrentar isso, trabalhar e construir esse consenso para que essas unidades de conservação possam ser utilizadas.

Bom, eu teria muito mais o que falar aqui, mas quero dizer ainda que estes documentos estão aqui na Casa, é um trabalho registrado dos últimos quatro anos, à disposição de todos os senhores e senhoras, e inclusive, Ver. Adeli, proponho que a condução do seu trabalho, neste momento, resgate, junto à nossa Comissão, esses eixos e busquemos - e já respondo aqui à comunidade indígena que falou - a cobrança do Executivo Municipal. Esses pontos já estão na mão do Executivo há dois anos, então precisamos ter a resposta da efetivação de todo esse processo. Muito obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Juliano Stella Karam, representante do Ministério Público Federal, está com a palavra.

 

O SR. JULIANO STELLA KARAM: Bom-dia a todos, eu queria parabenizar a Câmara pela iniciativa desta Audiência Pública, acho que ela é muito importante. Pelos depoimentos ouvidos aqui a gente percebe a importância disso.

Quando recebemos o convite para participar da Audiência Pública, o objeto dela era: Unidade de Conservação e Sustentabilidade Indígena, e em função da discussão de uma Lei Municipal que vai tratar desse assunto.

Aparentemente, pode haver algum tipo de contradição ou incompatibilidade entre unidade de conservação, proteção do meio ambiente e sustentabilidade indígena. O que eu queria ressaltar aqui é que essa incompatibilidade não existe do ponto de vista jurídico, nem do ponto de vista fático. E a minha fala vai se guiar, em grande parte, em função da Constituição, que é a norma maior e que rege, entre outras coisas, a produção das outras leis, e vai ter que guiar a produção dessa Lei Municipal.

Então, a Constituição estabelece alguns valores, alguns bens jurídicos, e dá proteção a eles, e entre eles está: o meio ambiente, no art. 225; o outro é a diversidade cultural, art. 215 e 216, e especificamente a diversidade cultural indígena, art. 231, e os artigos que seguem. Toda a norma que for feita neste País, em que haja afetação a esses bens, deve tentar compatibilizar esses bens, sob pena de inconstitucionalidade.

Hoje existe, está em vigor, desde 2000, uma Lei Federal que trata do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. E ela contempla estes dois interesses: o interesse das comunidades tradicionais e o interesse na proteção do meio ambiente. Contempla de que forma? Ela estabelece unidades de conservação de proteção integral, que são aquelas em que não é possível a presença humana, e estabelece unidades de conservação de uso sustentável, que são aquelas em que é possível a presença humana. Nesses casos, em que as unidades de conservação são essenciais para as atividades desses povos tradicionais, não pode haver unidade de conservação de proteção integral, porque não há hierarquia entre o direito desses povos tradicionais e o direito à proteção ao meio ambiente, isso tem que ser compatibilizado. Eu não posso pegar e colocar um acima do outro; diferente, se fosse uma propriedade privada. A propriedade privada é diferente da propriedade para os índios e para os povos tradicionais. Nos povos tradicionais, a propriedade não é exatamente aquela relação econômica que nós temos com a terra; a propriedade, para os povos tradicionais, ela é, além de um meio de subsistência, ela é decorrente de uma relação cosmológica, é ali que eles vivem e reproduzem a sua forma de vida. E é exatamente isso que a Constituição procura garantir; ela garante a existência e a sobrevivência desses povos. Se nós retirarmos os locais onde eles possam explorar a matéria-prima do seu artesanato, nós estaremos ameaçando o meio de subsistência desses povos, e isso é inconstitucional. Então, eu queria destacar isso.

É importante, acho que é extremamente louvável que Porto Alegre crie o seu Sistema Municipal de Unidades de Conservação; nós, do Ministério Público, temos atribuição para proteger esses dois bens jurídicos, e sempre que chega a nós algum tipo de conflito, nós tentamos trazer, buscar a compatibilidade, buscar o equilíbrio entre os interesses conflituosos que estão ali. E para que essa norma municipal seja constitucional e compatível com as outras normas do País, ela tem que assegurar a proteção do meio ambiente e assegurar mecanismos de participação e proteção dos povos que serão atingidos por essas restrições. Isso é essencial, e, a partir daí, eu acho que a gente pode buscar o debate. Isso vai depender certamente da criação de uma unidade específica, vai depender de um estudo prévio. Não é uma coisa que a gente possa criar por decreto, sem saber os efeitos que isso vai ter numa determinada comunidade, sob pena de ser questionado judicialmente. Acho que esse não é o interesse da Câmara, nem do Executivo Municipal. Acho que isso tem de ser estudado, é louvável, é importante para a Cidade, e a gente tem de buscar uma compatibilização entre esses dois interesses. E é isso que quer a Constituição, e é isso que a gente tem de buscar no caso concreto. Obrigado.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): O Sr. Luiz Fernando Caldas Fagundes está com a palavra, representando a Secretaria Municipal de Direitos Humanos e a FASC.

 

O SR. LUIZ FERNANDO CALDAS FAGUNDES: Sr. Presidente, Srs. Vereadores, Sras Vereadoras, participantes aqui presentes. Cinco minutos para falar tudo que já foi debatido aqui é difícil, mas vamos tentar sistematizar algumas questões.

Primeiro, a questão do Brique da Redenção, que está sendo contestada. Esta Audiência Pública é resultado de uma outra Audiência Pública que teve aqui, em dezembro do ano passado, quando os artesãos não indígenas do Brique da Redenção reclamaram de uma série de irregularidades. Naquele momento, os indígenas não foram convidados. Que bom que hoje eles estão aqui.

Vou mostrar uma foto que tiramos neste domingo, vou passar para vocês, de um trabalho muito bonito feito por artesãos não indígenas, das bolas Caingangues, da metade Clanico Caingangue, que está sendo exposta e vendida no Brique da Redenção por artesãos não indígenas, que estão reclamando que os indígenas utilizam produtos industrializados.

A nossa discussão, o nosso entendimento, é um pouquinho diferenciado. A questão não são os produtos; são o modo de produção. O modo de produção indígena é completamente diferente do modo de produção não indígena. É um modo de produção onde existe uma conjunção de parentes que se reúnem e fazem o artesanato. É uma construção coletiva. Cito um exemplo: para fazer uma cestaria, tem de ir ao mato, e com seus filhos. Não é só fazer a cesta, colher o cipó. É um processo de aprendizagem, que envolve educação, medicina, religiosidade. Então, é muito mais complexo do que simplesmente colher um cipó. Envolve ensinar seus filhos que determinada erva faz bem para curar, que este não é o momento de colher o cipó; e ali eu estou com meus parentes, construindo uma pessoa indígena. Então, eu estou ali distribuindo um conhecimento que é milenar. Estou distribuindo o meu conhecimento sobre o meu território, meu, indígena, claramente.

Bom, o que a gente quer dizer é que o modo de produção... Se compra semente da Amazônia, claro, o homem sai como se fosse à caça, e vai comprar semente da Amazônia. Aí ele traz a mãe, os filhos, bricolam, seus parentes juntam, produzem o novo produto. O que a gente quer dizer é que o modo de produção é tradicional. É completamente diferente do nosso modo de produção, que é individual. Então, aí está uma questão que não foi colocada aqui, o produto é aquilo que o Vherá Poty falou antes, a questão do quanto foi recebido, e a gente está tratando a questão não como artesanato, mas como bens indígenas, porque o que é produzido, o que é feito, construído, não é somente para comercialização, é feito para troca com seus parentes. Bom, então tem esta discussão.

A gente vai lançar agora em maio um livro que talvez dê conta disso; a Secretaria Municipal de Direitos Humanos está lançando um livro, construído, inclusive, com algumas lideranças indígenas. O Cacique Cirilo tem um artigo aqui, onde consta uma série de discussões em que os antropólogos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul apresentam as suas pesquisas.

Então, a gente não pode ficar repetindo aqui um discurso exigindo que o índio utilize um cocar. A gente sabe que, por exemplo, no Norte, os indígenas, um grupo de indígenas não usa cocar, mas eles se apresentam com cocar ao branco, porque o branco não entende outra coisa que não seja aquele estereótipo. (Palmas.) Então, nós temos que tentar aprofundar essa reflexão. Nós temos que buscar a Universidade, que é um grupo que constrói conhecimentos sobre povos indígenas, e é disso que nós temos que nos apropriar. Não temos que ficar repetindo uma construção que foi ideologicamente construída pelo Estado/Nação, que o índio tem que estar na natureza, que o índio tem que colher sementes. Então, nós temos que aprofundar essa discussão.

Bom, nós podemos falar, em termos de Prefeitura, respondendo ao Ver. Comassetto, sobre três pontos: naquele dossiê que foi feito por nós, pelo Núcleo de Políticas Públicas dos Povos Indígenas, junto com os indígenas. Quais os pontos levantados? A questão do comércio. Então, foi criado um grupo de trabalho - Povos Indígenas -, em 20 de novembro de 2008, e que vai começar a se reunir agora em maio. Certo? E está aqui o representante da SMIC desse grupo de trabalho e nós queremos, realmente, discutir uma demanda indígena que está aqui neste livro da FASC, que é uma Feira Autônoma em Porto Alegre, uma Feira só dos Indígenas, que esteja separada do Brique da Redenção. Isso é uma demanda indígena, e a Prefeitura de Porto Alegre, através da Secretaria Municipal de Direitos Humanos, está assumindo um compromisso de discutir isso dentro do grupo de trabalho para os indígenas.

A questão do passe livre: nós queremos propor à Secretaria Municipal de Direitos Humanos um estudo para Carris, para ver se há possibilidade de ter o passe livre em Porto Alegre neste grupo de trabalho. Mas relembrando, Vereador, o senhor e o Ver. Guilherme Barbosa ficaram de fazer este estudo e até hoje não apresentaram, nem na última reunião, nesta em que o senhor diz, e eu tenho aqui, se vocês quiserem eu posso mostrar; tenho aqui em áudio o seu comprometimento junto ao Ver. Guilherme Barbosa para apresentar este Projeto, e não apresentou. Então, nós temos de deixar claro que este é um espaço de reflexão, de conjunção de forças, e não um espaço, simplesmente, para dizer: “Ah! a Prefeitura não fez aquilo ou não fez isso”. Eu acho que é este o debate.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Fez uso da palavra o Sr. Luiz Fernando Caldas Fagundes, representando a Prefeitura Municipal de Porto Alegre, na Secretaria de Direitos Humanos e da FASC.

O Sr. Marco Antônio Macerata, da Secretaria Municipal da Saúde, está com a palavra.

 

O SR. MARCO ANTÔNIO MACERATA: Bom-dia a todos, à Mesa, à população presente. Eu venho aqui mais só para passar uma informação relativa à questão da sustentabilidade relacionada ao Agente Comunitário. Queria só dar uma lida num documento oficial da Secretaria de Saúde, se vocês me permitirem. Ofício datado de 16 de dezembro de 2008. (Lê.): “Ilmo Sr. Coordenador. Tendo por único objetivo a regularização da contratação dos Agentes Indígenas de Saúde (AIS), vimos, por meio deste, com base no Parecer anexo, formulado pela Procuradoria-Geral do Município de Porto Alegre, manifestar o total interesse da municipalidade em formalizar convênio com esse órgão governamental, viabilizando assim tanto a continuidade do serviço quanto a nomeação de novo(s) Agentes”. Nós também, dentro da Secretaria, estamos aguardando um Parecer Jurídico a respeito da legalidade dessa contratação. Então, isso é uma das questões que foram levantadas aqui em relação à interpretação da lei e à aplicabilidade da lei. Nós, mesmo dentro do Poder Público, muitas vezes, não temos como, vamos dizer assim, agilizar as coisas tão rapidamente, embora seja esse o nosso desejo e a nossa intenção. Só quero salientar o interesse em fazer esta contratação.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Fez uso da palavra, neste momento, representando a Secretaria Municipal de Saúde, o Sr. Marco Antônio Macerata.

 

O SR. ENGENHEIRO COMASSETTO: Fui citado aqui de uma maneira equivocada pelo expositor que representa o Município de Porto Alegre. Eu quero fazer o contraponto, porque a sua colocação não está verdadeiramente de acordo com o que foi construído.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Pelos nossos critérios, o senhor pode fazer um Requerimento ou uma Questão de Ordem.

 

O SR. ENGENHEIRO COMASSETTO (Questão de Ordem): Primeiro quero deixar bem claro aqui a todos ouvintes que neste processo, a Câmara Municipal de Porto Alegre atua como legisladora, ela constrói as leis. Quem executa é o Município de Porto Alegre. O Sistema Municipal de Transporte Público de Porto Alegre é regido pelo Executivo Municipal, pela Secretaria Municipal dos Transportes e pela Empresa Municipal de Transportes. Há um Conselho Municipal de Transporte Urbano. Portanto, toda decisão de tarifas, passes livres e outras questões mais, tudo é coordenado e executado pelo Município de Porto Alegre; inclusive esta Câmara não tem poderes de legislar sobre o valor das tarifas. Quero deixar isso claro aqui para que o representante do Executivo coloque as palavras com a sua devida correção. Quem executa é o Executivo. Está aqui o documento que nós encaminhamos ao Executivo com os quatro pontos. Ficamos, sim, responsáveis, assim como estamos aqui. Se o Projeto vier para esta Casa, vamos debater, vamos fazer a defesa dele dentro das proposições apresentadas. Mas quem faz estudos técnicos para apresentar a proposta do Executivo sobre o transporte público municipal não é esta Câmara, é o Executivo Municipal. A comunidade trouxe a reivindicação, encaminhamos para... E o representante do Governo expôs uma das demandas de até então, ou seja, iniciou o Grupo de Trabalho. Agora, as outras quatro, ainda não foram trazidas. Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Nós estamos em uma Audiência Pública, a Questão de Ordem foi feita, todas as pessoas puderam falar e se manifestar. Não há espaço para réplica e contrapontos.

 

(Manifestação fora do microfone. Inaudível.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Está anotado. O senhor teve o período de fala, eu lhe dei um espaço a mais. Nós temos outros espaços; inclusive coloquei anteriormente aqui. Faço questão de acertar, no final desta Audiência, com as senhoras e com os senhores, para que no processo - inclusive eu quero chamar para essa reunião, depois, o Dr. Bittencourt, da Comissão de Direitos Humanos - nós possamos fazer uma reunião para analisar todas as emendas, todos os documentos, porque me parece que o mérito é desta Comissão, mais do que da própria CCJ - Comissão de Constituição e Justiça. Então nós poderemos analisar todas essas questões. Nós temos 33 Emendas. Nós temos aqui uma prática democrática de ouvir todas as partes, os contrapontos; a Audiência era sobre Sistema Municipal de Unidades de Conservação, discutimos sobre ele, sobre o Brique e sobre outras questões correlatas sem nenhum problema. Audiência Pública tem exatamente este viés, esta formatação, e eu, como Presidente, quero cumprir rigorosamente aquilo que está determinado.

 

(Manifestação fora do microfone. Inaudível.)

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Não, se eu começar a dar contraponto para todo mundo, nós não vamos terminar nunca esta Reunião. Todas as questões estão devidamente anotadas. Inclusive, se alguém achar que não foi contemplado, eu aceito toda e qualquer manifestação, por escrito, e vou apensar ao processo. Podem colocar por escrito; eu já pedi ao nosso diligente Diretor Legislativo, Dr. Luiz Afonso, para colocar o documento que me foi entregue dentro do Processo; eu vou pedir as notas taquigráficas para fazerem parte do processo, e não será por insuficiência de debates e nem de documentos que esse processo não será amplamente discutido. Eu anuncie aqui, anteriormente, que, apesar do pedido de votação em Regime de Urgência, nós não tivemos acordo, e por isso continua aberto o debate nesta Câmara Municipal.

Eu queria, portanto, agradecer, de modo especialíssimo, a todos aqueles que vieram, nesta manhã, à Câmara Municipal de Porto Alegre, aos povos indígenas, artesãos, ambientalistas, cidadãs e cidadãos, Vereadores e Vereadoras que aqui estiveram, e à nossa Mesa, um agradecimento especial pela presença do Ministério Público, da Prefeitura, da Procuradoria da União e da Funai, para esta questão.

Com a palavra o Sr. João Maurício Farias, da Funai.

 

O SR. JOÃO MAURÍCIO FARIAS: Só a título de encaminhamento, pois percebemos, ao longo do tempo de discussão com as lideranças indígenas, que agora a Câmara também está tratando da questão do Plano Diretor, e, na medida em que isso acontece, tem o Projeto de Lei, que é o SMUC, e o Plano Diretor que também está tratando de questões relativas que vão bater na questão do patrimônio ambiental e cultural. Por esses dois motivos, e aí diretamente aos Vereadores - quero manifestar que essa questão não é uma questão de posição político-partidária -, a gente pede que tenham sensibilidade para isso e talvez fosse o caso do Executivo congelar esse Projeto por alguns meses, para que a gente possa discuti-lo com mais profundidade, e, quando chegar o Plano Diretor, a gente apresenta, trabalha com as Emendas do Projeto do SMUC, e se ganha tempo, senão corremos o risco por dois lados: de ele não contemplar de fato as Emendas indígenas e, por outro lado, se ele for aprovado dentro do Plano Diretor, ele chegar em desacordo com o Plano Diretor. Então, a gente está pedindo que o Executivo chame de volta o Projeto, que a gente construa com a SMAM o diálogo, com as lideranças, e reapresente o Projeto com as Emendas já resolvidas. Essa é a proposta.

 

O SR. PRESIDENTE (Adeli Sell): Queria esclarecer ao Sr. Maurício que as questões atinentes ao Executivo, eu peço que a Funai acerte aqui com a Prefeitura uma reunião de trabalho com a Prefeitura. Aqui, eu já não sei, anteriormente as lideranças não deram acordo ao pedido de votação imediata. Portanto, há espaço. E quanto às Emendas, as que foram colocadas na Comissão de Direitos Humanos, estão todas feitas, estão no processo, estão à disposição das senhoras e dos senhores, como eu disse anteriormente. Nove Emendas feitas por mim, Ver. Adeli Sell, e as outras Emendas de nºs 10 a 33, feitas pelo Ver. Guilherme Barbosa. Estamos, evidentemente, num processo legislativo em curso. Os Vereadores poderão fazer as suas Emendas, e vocês poderão discutir, indiscutivelmente, essa questão com o Executivo. Queria, mais uma vez, agradecer, de um modo especial, a presença de todos e todas aqui nesta manhã. Desejo a todos um bom dia.

Estão encerrados os trabalhos.

 

(Encerra-se a Audiência Pública às 11h38min.)

 

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